quinta-feira, 5 de abril de 2012

LIONEL MESSI


Na história do futebol, há exemplos de jogadores que, com a bola nos pés, expressaram simultaneamente talento, elegância e inteligência. Entre os três melhores jogadores da atualidade — Messi, Cristiano Ronaldo e Neymar —, Messi é o que menos tem elegância no toque de bola. Cristiano Ronaldo, embora não seja uma referência absoluta em elegância ao correr com a bola, mantém uma certa graciosidade que Messi não possui.

Messi é um jogador de talento, e seus resultados comprovam esse talento. No entanto, não tem a elegância com a bola nos pés que marcaram seus compatriotas Di Stéfano e Maradona. Há algo em Messi que bloqueia sua elegância corporal, que deveria emergir naturalmente pelo fato de ser um grande jogador. Com a bola no pé, ele se comporta como um deus que se dissolve no jogo, mas um deus destituído de graça corporal. A bola gruda em seu pé como se fosse uma extensão dele, e ele, uma extensão da bola. Se analisarmos seus gols, do primeiro como profissional até os mais recentes, notamos um padrão tautológico: todos seguem os mesmos gestos. Falta-lhes a graça dos movimentos e a elegância que havia nos gols de Maradona.

Messi, apesar de seu talento inegável, não herdou a leveza e a sofisticação gestual de Ademir da Guia, Garrincha, Pelé, Zico, Falcão ou Zidane. Seu corpo guarda uma certa rigidez, uma mudez expressiva que lembra a forma de comunicação corporal das pessoas com síndrome de Down. Não digo isso para denegrir Messi nem aqueles que têm a síndrome, mas para ilustrar que a comunicação quinésica de seu corpo não transmite a mesma elegância dos jogadores citados. Ou talvez seja uma limitação minha, uma deficiência perceptual que me impede de enxergar elegância no futebol de Lionel Messi.


INTERESSE





No filme Pickup on South Street (1953), Samuel Fuller aborda, de forma magistral e subliminar, o interesse na relação humana. Seis anos depois, Robert Bresson realiza Pickpocket, onde esse interesse assume um caráter compulsivo, acompanhado de um sentimento de culpa. Se, no filme de Fuller, ele é coletivo e instintivo, em Bresson, é solitário e pecaminoso. Enquanto Fuller foca na felicidade e nos desdobramentos desse interesse, Bresson o apresenta como um pecado original que exige purificação — uma purificação que se dá no aprofundamento do próprio interesse.

Particularmente, prefiro Pickup on South Street, de Fuller, por razões que não me sinto à vontade para expor, a fim de não colocar uma obra contra a outra.

O filme esteve disponível na íntegra no YouTube, até que aqueles interessados em seus direitos autorais o tornaram indisponível. Os direitos autorais, segundo Fernando Brant, “são uma conquista da civilização”. Enfim, um tema para se pensar enquanto interesse.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

BARBARA EVANS



Engraçado que escrevi um texto para postar no Natal, mas fiquei me autocensurando, achando que estava magoando os sentimentos daqueles que ainda creem no Natal. Mas o Natal passou, e a autocensura também passou. Então, posto o texto que era para ser postado no Natal, posto até mesmo porque este é o último ano do mundo, e como não haverá mais mundo, vou aproveitar o que ainda existe.

Segue o texto: Se Deus existe, é possível que ele goste de mim, ou me odeie por eu desacreditar na sua existência. E, para me castigar, ele me deixa vivo. Mostra-me que seu reino cresce a cada dia que passa. Neste Natal (de 2011), a revista Playboy, acho eu, com o consentimento divino, estampa em sua capa, para a felicidade dos lobos, a anjinha da filha de Monique Evans, a Bárbara Evans. Pena que, depois que passei a consumir Coca-Cola e energético, perdi o meu libido, e não poderei devassar a anjinha da Bárbara Evans.

A mãe, Monique Evans, eu comi várias vezes, com a satisfação de um lobo, protegido pelos ladrilhos dos banheiros, que me serviram de exílio. Mais um Natal, e quando não se gosta da ideia de que, nessa data, nasceu um menino chamado Jesus, e também não se encontra nada que possa salvar da vida, nem mesmo as guloseimas natalinas, ou uma festa no meio do mato que exalta o êxtase tribal, a melhor coisa a fazer, acho eu, é ficar em silêncio. Revoltar-se contra a vida só leva ao nada. Então, aconselho aos fortes e aos fracos, que passam pelos apuros da adjetivação dessa data festiva: fiquem em silêncio. Não emitam juízos sobre a vida, porque vocês podem sofrer os percalços do nada. Não fume crack, não cheire e não se aplique cocaína, ou heroína, pois cheirar e fumar fará você perder a sensação de que a vida é uma merda, e que essa data é um paliativo aos odores podres dos ideais humanos. Por isso, a coisa mais importante da vida é ver e sentir o infinitivo que ela é. Caso encontre o autor deste texto em alguma ceia de Natal, não se assuste, ele sofre de transtorno bipolar.

Portanto, não peça benção aos santos, porque a glória dos santos é feita de transtorno bipolar. Nem faça meditação, porque você corre o risco de se tornar mais bizarro do que David Lynch. Nem caia na loucura de ser budista, porque isso criará a falsa sensação de que é a religião mais bela do mundo. E acreditar que o budismo é uma bela religião é um grande perigo. Encontre, pelo menos, um meio de ter uma fonte de renda que não dependa da bondade ou da corrupção alheias. Se alguém sorrir para você, não devolva o sorriso espontaneamente, pense no sorriso que você dará. Existem tantos risos. 

E se for sorrir para um chato, ou para um especialista (construtores burocráticos), que acha que arte e economia salvam a vida, ou então, sorrir para um otimista, que acha que viver é decorar as coisas feias da vida com presépios natalinos, ou ainda, sorrir para um pessimista, carente em uma noite de fraqueza, tome mais cuidado, pois são mais perigosos do que a anjinha da Bárbara Evans. A noite de Natal é a noite em que os animais políticos mais se odeiam, mas é Natal, e, por isso, os animais políticos não se matam. Do ponto de vista otimista, o Natal serve para confraternizar nossa hipocrisia e refiná-la em requintes elegantes, que só os animais políticos são capazes. Viver é um ato subjuntivo.